Dando nomes ao gado. (Texto 1 de 3)

Antes de dar início aos textos, um desagravo. Pode parecer que uso a imagem de Regina Duarte para chamar atenção a meus escritos. Também pode parecer que estou defendendo Regina para angariar simpatia de seus admiradores. Não é o que se sucede.

Não quero ser hipócrita. Não faço parte dos que citam de cor e salteado cada papel seu como atriz. Não acompanhei a carreira de Regina como fez minha mãe. A dramaturgia brasileira não faz parte de meus interesses. Conheço-a como que de vista, ou ”por ouvir falar”. Assisti, portanto, a entrevista da Secretária de Cultura do atual governo à CNN sem estar enamorado da ”namoradinha do Brasil”. E o que vi ficou entalado na garganta.

Nem me é possível discutir questões ideológicas. Aquilo não foi entrevista, foi absoluta falta de respeito com uma senhorinha que chegou toda animada para falar de projetos e de seu novo trabalho e saiu maltratada e desaforada. Eu me senti constrangido ao ver aquilo.

E decepcionado por não ver o governo sair oficialmente em sua defesa. (fora o breve comentário do ministro do turismo) E ver também que artistas (500 deles), grupo quase tão corporativista quanto o poder judiciário, em lugar de defendê-la, agridem-na tão somente por estar ao lado do presidente.

Típico funcionário público brasileiro.

Isso dito, sigamos.


Não vive quem fica arrastando cordéis de caixões.
Regina Duarte 07/05/2020

Não sou advogado de Bolsonaro, nem este texto intenta defendê-lo. Tampouco adiantaria: “O diálogo somente se dá entre iguais e diferentes, nunca entre antagônicos.“. É impossível conversar com quem é contra a priori. Já escrevi sobre isso aqui. Na política brasileira hodierna ambos os lados alimentam-se com mais do mesmo, um lado não escuta o outro. É perda de tempo tentar explicar-se a outrem.

Bolsonaro não é um santo. É um homem como outro qualquer. As acusações sobre si precisam ser investigadas. Os indícios de envolvimento com milícias e acobertamento de faltas de seus filhos devem ser examinados com todo o rigor, e tais desvios punidos se for o caso. Ele deve ser investigado sim, tal como todos os ministros do STF e tantos e tantos outros com foro privilegiado. 1 Afinal, por que só ele? Querem fita de reunião, querem que se pronuncie sobre tudo, querem até exame de sangue (!), qualquer coisa que possam usar contra ele. Só não encontraram ainda indícios de corrupção no atual governo.

  • A questão não é o que é dito, mas sobre quem é dito.

A esquerda brasileira não aceita que perdeu as eleições. Enquanto eles roubavam e a população se mantinha calada passivamente, havia democracia plena. Sair do poder foi um golpe. E agora, qualquer reclamação contra os poderes Legislativo, Judiciário e Imprensa (contrários ao Executivo) é um ataque à democracia. Mas é ”democrático” criticar diretamente ou indiretamente Bolsonaro.

Porém o que ora fazem é mais birra de quem perdeu gincana do que oposição política. Não há interesse em procurar fazer justiça, e sim em preparar a futura disputa eleitoral. O problema nunca foi ”ser miliciano”, mas é ser ”de outra facção”. Pois, com a mais absoluta certeza, se fosse alguém da patota comunista, não haveria mais do que uma charge no jornal. Enquanto isso, é bem sabido o envolvimento de magistrados e políticos de partidos de esquerda com famosos grupos criminosos organizados.

  • A questão não é o que é dito, mas contra quem é dito.

Bolsonaro tem a elegância, a etiqueta e a eloqüência de um protozoário. Incapaz de se expressar livremente por dois minutos sem dar coice em alguma coisa. E daí? Quando membros da ”esquerda” disparam impropérios, disparates e barbaridades, são bem quistos, bem vistos, bem acatados.

Bolsonaro é machista, homofóbico 2, misógino, racista, impudico…
Mas e quanto à mulher de Ciro Gomes, que só servia para transar com ele?
Mas e quanto a Lula, que disse Pelotas ser ”exportadora de viados”, que conclamou ”as mulheres de grelo duro”, que urinou nas calças em público por estar bêbado? Mas e quanto a Chico Buarque ”batendo na Geni”?

A direita é violenta, fascista e antidemocrática…
Mas e quando Benedita da Silva disse que haveria sangue na luta?
E quando Gleisi Hoffmann disse que para prender Lula tinha que matar gente?
E quando o líder da CUT conclamou guerrilha popular?
E quando o MST depreda patrimônio alheio?
E quando o reitor psolista disse com todas as letras que um bom homem de direita deveria ser morto por um bom fuzil?
E quando um professor de federal fala que bolsonaristas devem ser fuzilados?
E quando Ciro diz que recebe turma do judiciário na bala?
E quando Lula incita trazer os protestos violentos do Chile para cá?
E quando Cid desfila de retroescavadeira? 3

Manifestações democráticas da esquerda.

 

Nada disso conta.

  • A questão não é o que é dito, mas quem é que disse.

Joice Hasselmann, Arthur do Val, Alexandre Frota e vários governadores foram eleitos na onda ”bolsonarista”. Durante a campanha, foram constantemente atacados pela imprensa, sendo-lhes imputada a pecha de fascistas e retrógrados. Após as eleições, flertam com seus não tão antigos opositores e tais alcunhas lhes são exoneradas. Sérgio Moro concentra em sua imagem o exemplo perfeito da hipocrisia da esquerda. Após deixar o governo animosamente, não sabem se devem ou não apoiar quem prendeu seu líder popular.

  • A questão não é o que é dito, mas se favorece a narrativa.

O que fizeram com Regina Duarte na CNN foi das maiores deselegâncias da TV. Não sei o que foi maior ali: militância ou falta de etiqueta. Se ela tivesse seguido o decorado discurso socialista, seria livre pensadora e um exemplo da ”classe”, vocábulo marxista segregatório insistentemente usado pelos âncoras. Mas ousou divergir e foi achincalhada em rede nacional por isso. E é gado do curral presidencial, por seu ”ufanismo” e por sua ”retórica bolsonariana” como adjetivaram as grandes revistas políticas.

Presidente tietando Regina Duarte.

Até agora nenhuma evidência que comprove inequivocamente as suspeitas contra a família presidencial foram apresentadas a público, mesmo com um mundo contra ele. Ou é um criminoso excepcionalmente brilhante (o que vai de encontro às suas evidentes limitações), ou é um sujeito desbocado contrário ao conto de fadas da esquerda. Creio ser nisso em que Regina acredite, assim como milhões de brasileiros ora alcunhados como gado.

Melhor sermos gado de um homem que aparenta ser honesto do que sermos de outros que se sabe serem ladrões. Queremos acreditar que este país possa dar certo. Queremos olhar para frente. Queremos ”deixar a minoria barulhenta pra lá”. Queremos construir algo novo, olhar para o futuro, fazer melhor do que foi feito antes. Mas um grupo insiste em querer olhar somente para trás, seja para 2018, seja para 1964. Ou para o futuro 2022.

A hipocrisia está vencendo a esperança.  Entre passado e futuro, a disputa prejudica o estagnado presente. .
Fim da parte 1 de 3


  1. Foro privilegiado é a institucionalização da corrupção. Ver também:  O povo no poder – Uma crítica ao governo de Jair Bolsonaro 
  2. Detesto esse neologismo ideológico, tanto quanto feminicídio e afins. 
  3. Imagine agora o Biroliro numa retroescavadeira avançando contra o MST. Em seguida imagine a repercussão na imprensa. Este é meu exemplo máximo de dois pesos e duas medidas.