
Mais uma vez fui contemplado com a subtração de pelo menos um domingo. O governo decidiu pelo meu arrebatamento e, após tantos anos, serei mesário de novo. Tenho certeza de que, se suas excelentíssimas eminências tivessem lido as coisas que escrevi sobre as urnas eletrônicas, não teria sido convocado. Provavelmente iria preso mesmo… |:^(
Fui mesário e presidente de seção quatro vezes no passado, ainda à época em que trabalhava no Banco do Brasil. Essa empresa chinfrim não me pagou os dias devidos. Sabe, quando você trabalha para a justiça eleitoral, além de você ganhar o vale-coxinha do dia, você ganha alguns dias de folga em seu trabalho. São dois dias para os mesários e quatro dias para os presidentes de seção. Isso é remanescência da época em que a votação era feita por cédulas em papel. Esses dias eram os usados para fazer a contagem manual das cédulas. Hoje a votação é eletrônica, não existe mais a contagem (se é que você me entende), mas os dias continuam sendo dados.
Acontece que o Banco do Brasil se recusou a dar meus dias como presidente de seção e só me deu os dias como mesário (metade). Primeiro emprego; vinte anos de idade; sabendo nada da vida; não reclamei. Não foi só isso que os patifes deixaram de me pagar, mas pararei por aqui mesmo: contar as peripécias que vivi naquele rendez-vous daria um livro inteiro. Só que a féria do livro não pagaria os calmantes para segurar a vontade de esganar uns e outros…
Voltando às eleições e à política brasileira (esta, outra patifaria e rendez-vous), até que trabalhar como mesário é tranqüilo. Eu reclamo que é uma chatice ficar com o bumbum quadrado de esperar o pessoal para votação, mas no fundo acho bacana a gente participar de alguma coisa cívica.
Eu também gosto de ficar vendo formiguinhas andando enfileiradas, então pode ter alguma coisa a ver.
Este ano mamãe e eu fomos fazer a tal da biometria. Eu não gosto nem um pouco dessa história de o governo, ou qualquer um, coletar meus dados biométricos. Darei um exemplo para explicar como penso. Você tem uma conta no banco e conseguem roubar sua senha. Você bloqueia a conta, muda a senha, problema resolvido. Você tem um cartão de crédito e conseguem clonar seu cartão. (Já aconteceu comigo. Três vezes. E, sim, no mesmo banco patife citado acima.) Eu pedi o bloqueio do cartão, mudei a senha, pedi segunda via do cartão, problema resolvido.
Você deu sua digital para o banco. Roubaram sua digital. Não tem segunda via. Acabou. Para o resto da sua vida sua informação personalíssima estará comprometida, pois sabe-se lá quem vai ter acesso a esse dado dali em diante? Por isso eu me recuso a dar meus dados biométricos para qualquer empresa. Hoje ela está com um dono, amanhã com outro… Funcionários vêm e vão… Eu não sinto segurança nenhuma nisso.
Agora responda: você crê ser seguro dar esse dado tão precioso para o governo? Nem me refiro ao governo brasileiro, refiro-me a qualquer governo no mundo. Será que, depois da Peste Chinesa e do caos que foi essa fase tão recente que escancarou a completa incompetência e prepotência de proto-ditadores, ninguém aprendeu nada?
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Seja como for, fui obrigado (por aquele cujo nome não pode ser pronunciado versão brazuca) a fornecer minha digital, foto de meu lindo rostinho, minha assinatura… Faltou só o exame de fezes. Alguns meses depois de esse recadastramento ter sido feito, fui recapturado para ser mesário. Recebida a carta intimidatória, aproveitei que a UERJ está mais uma vez em estado de greve e que hoje não teve expediente para ir lá resolver.

Levei toda a documentação, até crachá do emprego. Não precisou de nada além do número do título e tudo foi resolvido em menos de cinco minutos. A atendente conferiu meus dados, pediu para eu repetir o número de telefone cadastrado e me incluiu no grupo de zapzap da zona eleitoral. E eu pensando com meus botões: “é sério isso?”.
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Minha aversão ao zapzap se deve a vários fatores, que podem ser conferidos no texto acima. Porém, à parte de minha repulsa pessoal, essa foi uma decisão administrativa que me incomodou. Pois não apenas centenas de números de telefone ficaram disponíveis para mim, como também o meu número de telefone ficou disponível para centenas de pessoas. É só clicar em “informações do grupo” que aparecem fotos e números de telefone de todo mundo.
Eu fiz os cursos sobre a nova Lei de Proteção de Dados Pessoais. Em meu entender, essa decisão administrativa resultou no vazamento de dados pessoais (número de telefone e foto). No meu caso, meu número de telefone já é exposto. Está em meu cartão de visita, que mamãe sai distribuindo para todo mundo que encontra por aí na esperança que alguém leia meus textos… |:^p
Mas e para quem quer ter privacidade? Imagine seu número privado sendo distribuído para um monte de gente que você não conhece! Eu achei isso muito estranho e também penso que isso pode ser problemático…
Voltando à história: fui lá, puseram meu número no zapzap deles (e dum monte de gente) e me liberaram. Na prática, fui para perguntarem de novo qual é meu número de telefone. Daí era só aguardar que as instruções para terminar o processo seriam enviadas pelo celular.
Assim, chegando a casa, tive de entrar no zapzap para descobrir onde pegar a tal “Carta de Convocação” (a oficial, não a intimidatória). Segui as instruções, mas não deu certo. Descobri então outro caminho para o tal do “Convoca-e“, o novo sistema eletrônico de convocação de mesários. Nesse terceiro sistema, dei meus dados de novo. Ó, raios, quantas bases de dados esse povo tem?
E, para minha jovial alegria e ditosa felicidade, o treinamento também tem que ser feito por “aplicativo”.

Agora é aguardar a ”festa da democracia” e cumprir minha obrigação cívica. Ou o juiz da comarca ler o que escrevi sobre as eleições. O que vier primeiro.
Editado 24/08/2024: apenas um adendo.
Você sabia que todos são iguais perante a lei? Exceto quando você tem prioridade para votar (ou para qualquer outra coisa).
No caso das eleições, votam primeiro os candidatos, os juízes e os promotores eleitorais (qualquer servidor da justiça eleitoral, na verdade). Mas os mesários são os últimos a votar. Somos arrebatados para o serviço “democrático”, mas só votamos se não tiver mais ninguém na fila, às vezes, só no final do dia.