Infância ameaçada: série sobre abuso sexual infantil (parte 5).

CONVERSA SÉRIA
A importância da educação sexual desde cedo
LEILIANE ROCHA é psicóloga e criadora do programa Esepas (Educação Sexual, Emocional e Prevenção ao Abuso Sexual). Ela usa as mídias sociais para alertar pais e cuidadores sobre o problema (instagram.com/ leilianerochapsicologa)
Texto adaptado

Quando falamos sobre prevenção ao abuso de crianças, a educação sexual é a ferramenta mais poderosa para evitar e combater a violência sexual. Não se trata apenas de falar sobre partes íntimas ou “de onde vêm os bebês”. Ela deve ser relacionada ao processo de ensino e aprendizagem sobre a sexualidade humana, que engloba emoções, respeito e conhecimento do corpo, relacionamentos e auto-estima.

O processo de desenvolvimento da sexualidade da criança depende da educação sexual que ela recebe. Por isso, estamos falando da formação da identidade e da personalidade dela. Estudos apontam que a criança que é bem orientada quanto a esse aspecto tende a ter uma visão mais positiva do seu corpo, é capaz de desenvolver relacionamentos mais saudáveis, tem melhor rendimento escolar, cresce com sua identidade e auto-estima mais sólidas, consegue perceber mais fortemente a afetividade dos pais e acredita que pode confiar mais neles.

Para começar esse processo de ensino sobre autoproteção, sugiro que você apresente à criança quatro conceitos básicos: consentimento, limite corporal, intimidade e tipos de toques.

COMO EM QUALQUER PROCESSO EDUCACIONAL, A EDUCAÇÃO SEXUAL TAMBÉM DEVE SER SISTEMÁTICA E INTENCIONAL

  1. Jamais insista para que a criança ofereça carinho ou interaja com quem ela não se sinta bem naquele momento. É muito comum forçarem as crianças a beijar ou abraçar quem não querem. Isso atrapalha diretamente a formação do direito sobre o corpo, o limite corporal e a compreensão sobre consentimento. Quando estiver fazendo qualquer brincadeira com ela, como cócegas ou girar, por exemplo, e a criança pedir que pare: pare! Ensine que “não” e “pare” são pedidos importantes que precisam ser atendidos.
  2. Não permita que ninguém faça piadas ou comentários sobre as partes íntimas do seu filho. Já acompanhei muitos casos nos quais avós, tias e outros parentes diziam coisas relacionadas às genitálias das crianças. Nem os pais devem fazer esse tipo de brincadeira, pois pode erotizar a criança, dificultar seu aprendizado sobre intimidade, privacidade e limite corporal, deixá-la mais vulnerável ao abuso e ainda levar a criança a praticar isso com outras crianças.
  3. É fundamental deixar claro para seu filho quais são as partes íntimas: pênis, vulva, bumbum e mamilos. De maneira prática, fale que partes íntimas são as partes cobertas pela calcinha, cueca e biquíni.
  4. Nunca diga à criança: “Ninguém pode tocar em suas partes íntimas.” Isso não é verdade. Em algumas situações haverá alguém que poderá, fora você. Por isso, é fundamental a criança saber quem pode tocar, quando pode tocar e como pode tocar.
    Quem pode. Nomeie com a criança as pessoas que fazem parte da rede de proteção dela, isto é, aquelas que compõem a sua rede de apoio. Isso vai depender do contexto de cada família.
    Quando pode. Mesmo fazendo parte da rede de proteção, precisamos deixar claro para ela quais são os momentos em que essas pessoas podem tocá-la. Por exemplo: no banho, para higienizar após o xixi e o cocô, para passar algum remédio (se necessário) ou no exame pediátrico.
    Como pode. Esclareça como deve ser esse toque de cuidado. Ele tem duas características: é rápido (só o tempo de limpar, lavar e examinar) e não pode ficar em segredo. Por isso, oriente: “Filho, se alguém tocar em seu corpo e pedir que não conte pra ninguém, é sinal de que essa pessoa não quer o seu bem. Conte-me logo. Eu sempre vou acreditar em você!” O segredo é uma das ferramentas mais poderosas do abusador.

COMO COMEÇAR A FALAR SOBRE EDUCAÇÃO SEXUAL?
1. Busque conhecimento. Não tem como educar a criança sobre sexualidade com o pouco conhecimento que a maioria dos pais possuem. A família é soberana na educação sexual dos filhos.
2. Adquira livros infantis sobre o tema, conheça músicas, dinâmicas e atividades. A linguagem e as ilustrações ajudam muito os pais a transmitir os conhecimentos e as crianças a aprender.
3. Utilize situações cotidianas, como a hora do banho ou troca de roupas, para ensinar sobre como o corpo é importante e especial, e como proteger cada parte dele.
4. Sempre que a criança fizer uma pergunta sobre sexualidade, não ignore ou diga que ela não tem idade para saber. Se não souber a resposta, diga-lhe que vai pesquisar e responder em breve. Cumpra a promessa feita.

Esses ensinamentos não podem acontecer de forma esporádica ou somente em uma conversa. É necessário que seja no cotidiano, pois como em qualquer processo educacional, a educação sexual também deve ser sistemática e intencional. Portanto, seja protagonista da formação da sexualidade dos seus filhos.

 


Fonte: https://downloads.adventistas.org/pt/ministerio-da-mulher/materiais-de-divulgacao/quebrando-o-silencio-2024/