Condicionador de ar é o nome do aparelho. Ar condicionado é o que sai de dentro dele.

*Condicionador de ar é o nome do aparelho. Ar condicionado é o que sai de dentro dele. Nesta terra em que eu tenho que explicar isso para os outros, não se admire de me ler escrevendo ”isopor”.

Natal.
Calor.
Emputecimento por conta do calor.

Então, passado pouco mais de um ano, é chegada a hora de novamente religar o condicionador de ar, que passa a maior parte do ano na proteção de isopor em que veio. (Isopor é marca registrada, mas se eu falar, poliestireno quase ninguém sabe o que é…).

Gordo como uma porca prenhe, suando como toicinho na brasa, pego o pesadão condicionador de ar com a pouca coluna que me resta e coloco-o novamente na janela. Janela? Claro! Você realmente acha que eu vou fazer obra para ter ar condicionado em casa? As infinitas gambiarras em minha casa demonstram de forma inequívoca e categórica minha nacionalidade brasileira. E para sobreviver ao calor carioca, nada melhor que uma boa gambiarra refrigerativa.

Primeiro você manda fazer um tablado de metal para apoiar o aparelho em cima, de forma que não esmague os trilhos da janela de correr. Em seguida você apóia o telhadinho que comprou para ele não enferrujar por conta de chuva. Mas o telhadinho bloqueia a entrada de ar de cima dele. Então você coloca um tijolo (de isopor) para dar altura e o aparelho não fritar.

Aparelho “instalado”, você precisa bloquear o resto da janela que ficou toda aberta, para o ar não escapar. Afinal, você não vai pagar para esfriar a vizinhança toda, só sua sala. Após anos de experimentações constantes, com papelão e fita adesiva, lona e outros materiais, o método científico me levou a bloquear com toalha plástica e pregadores de roupa decorativos (que recebi de presente da Dona Rose).

Para a toalha não ficar voando com o vento quente da rua, eu coloco um peso em cima dela. No caso de hoje, o secador de cabelos que, com esse calor, não terá uso por algum tempo… Já as laterais são bloqueadas com algum tecido (algo que não falta na minha casa e que a Sophia está fazendo questão de mudar). Toalhas de banho ou de mesa etc. Desta vez foi um lençol.

Ótimo! Aparelho instalado e vento quente bloqueado. Vamos ligar! Assim, após pouco mais de um ano, religo o aparelho. Em dezembro! E ele não explode!

Quinze minutos e o cheiro de queimado começa a subir. Minha casa com sua fiação de 1950 torna difícil ter aparelhos elétricos. A única tomada por recinto acaba tendo que ser multiplicada por extensões e benjamins. E, com este calor, a extensão derreteu… Pior foi na hora de tirar o adaptador da extensão derretida: o pino de cobre ficou preso. Daí eu tive que usar um alicate de corte para quebrar a extensão e salvar o pino de cobre do adaptador e reimplantá-lo à força com a ajuda de uma parede e minha pança.

Toda essa saga devidamente supervisionada nos mínimos detalhes pela Sophia e seu focinho gelado. E ficamos sem ar condicionado no primeiro dia.

No segundo dia (hoje) ainda mais calor. Minha mãe, que já não é uma pessoa paciente, hoje está para me matar. (Ela me pôs no mundo, então tem o direito de me tirar dele a chineladas). Ela trouxe todas as extensões que há aqui em casa. Afinal, o filho de suas entranhas pode sofrer com a agonia oriunda do Sol escaldante, mas a Sophia, a cachorrinha nova, não pode ficar neste calor.

Então, para me certificar de que desta vez a sala vai ficar ainda mais fresca do que o esperado, resolvo fazer uma nova gambiarra. Graças ao meu grandiosíssimo intelecto que habita este telencéfalo altamente desenvolvido, pego um dos lençóis velhos que servem para Sophia treinar sua habilidade de rasgar coisas e improviso uma cortina entre a sala e a cozinha, devidamente afixada com fita crepe. Às vezes surpreendo-me com minha própria genialidade. (e mendigaria tenacidade para não fazer obra)

Tudo pronto: nova extensão, cortina na cozinha, até “consertei” a tomada que estava solta dentro parede há 15 anos! Liga-se a máquina! E o vento fresco invade a sala, como uma brisa de alento aos sofredores deste mundo.

Now I know how it FEELS!

“Olha, Sophia! Vento fresquinho! Você vai adorar!”.

Faltou combinar com a cachorra… O mais novo membro da família é resgatada e ela tem medo de quase tudo. Quando eu mexo em qualquer fiação, ela se esconde. Certamente deve ter apanhado de fio também. Conforme o tempo vai passando, ela vai perdendo os medos. Já perdeu medo de sapato, medo de chinelo, medo de vassoura, medo de rodo… Teve pesadelo com o foguetório de Natal*.

Como ela ficava ao relento, é natural que tenha medo de vento e chuva, embora ela tenha mais medo do barulho da chuva do que da água em si. Ela não gosta de se molhar, mas não deixa de ir lamber minha mãe quando chega embaixo de uma garoa. (Comigo não, ela só olha de longe, como quem diz: “Você acha que eu vou molhar meus pés, seu serviçal? Entra logo e me dá comida.”).

Com isso é bastante difícil esfriar esta criatura que não pára quieta um minuto.

1) Molhar? Nem pensar. Ela não gosta de água (e o borrifador é usado para repreender quando faz algo errado, como comer lagartixa).

2) Vento? Não dá. Ela foge de ventilador, não fica nem perto. Nestes dias em que estamos ligando o ventilador ela faz o possível para se esconder do vento.

3) Gelo? Até agora a única coisa que aceitou foram cubinhos de gelo, que a gente põe para ela lamber. Ajuda a esfriar um pouco a cachorra e dá a ela alguma coisa para fazer que não seja correr desvairada pela casa.

E tentamos o ar condicionado. Ela fugiu dele, preferindo ficar no quintal. Até a peguei no colo para ficar um pouco na sala, mas foi mais tempo de quintal do que de ar condicionado… Espero que com o tempo ela se acostume, afinal, ar condicionado no Natal desta cidade de ruas sem árvores não é luxo, é questão de sobrevivência! Se não, já sabe:

Filme alemão de 1977. Resultado do que acontece quando os produtores emendam um filme de terror pelas costas de um diretor que queria que fosse uma comédia. Um retrato do carioca médio no fim de ano.

 

* Em nota: se você gosta de soltar fogos nesses festejos, sem se preocupar com animais, idosos, bebês e autistas, faça o favor de, da próxima vez, explodi-los em seu cú.