E então, como é ser mesário?
Completando esta trilogia cívica, relato a quem curioso esteja como é o típico dia de um típico mesário suburbano carioca. Eu havia sido mesário e presidente de seção há muitos anos, mas acabei esquecendo os detalhes dessa deliciosa experiência de servir à nação.
Você acorda mais cedo que quase todo mundo. Menos o pessoal do TRE e os presidentes de seção, que já estão lá te esperando no local de votação. Cheguei às 06h20, para tirar a zerésima às 07h00 e começar a receber o povo às 08h00.
O trabalho é realmente muito muito simples. Recebe pessoa, cata nome, manda votar, entrega papel, chama o próximo. Recebe pessoa, cata nome, manda votar, entrega papel, chama o próximo. Vai almoçar, engole um bate-entope e volta. Repete os passos 1 e 2 e o dia já acabou. (Realmente passa muito rápido.) É um dos serviços mais tranqüilos que você poderia ter. De novidade, só não gostei que criança não pode mais acompanhar o adulto para votar. Todos nós mesários votamos com nossos pais. Era uma forma de transmissão do civismo. Agora não pode mais… |:^/ Ao final, você empacota tudo e manda para o TRE.
Eu me lembrava só dessa parte. Parece que minha mente se esqueceu de um pequeno detalhe: o povo. Estamos falando de seres sem as mais rudimentares noções de urbanidade, espaço pessoal e até mesmo higiene. É certo que não sou exemplo de elegância, etiqueta e garbo. Muito menos simpatia. Porém isso não invalida meu sentimento de repugnância ao ver que votam:
- A velharia que chega duas horas antes de os portões abrirem para “não esperar na fila”;
- O sujeito que pára em frente à urna sem saber apertar botões;
- Mulheres diferentes revezando a mesma criança para ganhar prioridade;
- Os homens que aparecem segurando aquela mesma criança no colo para ganhar prioridade também;
- E uma vagabunda desgraçada batendo numa criança de colo;
- Pessoas completamente desorientadas sem saber o que foram fazer ali;
- Mulheres usando roupa de boate (ou prostíbulo);
- E gente molambenta não por pobreza, mas por desleixo;
- O sujeito que lambe o dedo antes de registrar a digital e baba o aparelho todo (lambeu e babou umas 4 vezes);
- A pessoa que quer fugir com o comprovante sem ter votado;
- A pessoa que arranca a caneta da sua mão;
- E o que mais me causa espécie: ver como as pessoas conservam e tratam seus documentos de identificação (trauma bancário).
“O sujeito que pára em frente à urna sem saber apertar botões” não tem condições intelectuais suficientes para fazer bom juízo acerca de quem deve administrar o aparelho estatal. Já aqueles que demonstram mesmo em suas pequenas ações cotidianas uma personalidade egocêntrica, não têm índole para fazer escolhas que beneficiem a sociedade antes de si mesmos. Metade das pessoas em minha seção eleitoral não foi votar. E, da metade que foi, parte considerável não deveria ou merecia ter o direito de votar (uns 25% talvez…).
Ao menos dentro da zona (eleitoral) há alguma parcimônia nos temperamentos. No entorno, porém, a situação beira o ridículo. Todas, repito-me, todas as biroscas de meu bairro estavam fazendo churrasco. Nunca vi em todos estes anos de eleições tanta gente nas ruas, bebendo e gritando, entre pagodes e arruaças, sobre a imundície de um mar de santinhos em que escorreguei (não cheguei a cair). Saindo de meu local de eleição, diretamente à frente, há um bar. Estava mais do que lotado: as mesas estavam ocupando boa parte da rua impedindo a passagem de carros.
Estavam embebedando-se desde o início da manhã e continuam as ébrias esbórnias até agora, tarde da noite.
Esse é o povo que vota. Tem o governo que merece.
Cumprida minha obrigação cívica, retorno para casa.
Minha mãe me fez tomar banho de sal grosso (ela rezou o terço de São Miguel).
E ganhei R$ 60,00 de vale-coxinha pelo dia.
